Algumas questões passaram a ser formuladas, no sentido de se seria possível suspender ou reduzir as cotas condominiais.
 A descoberta de um agente difusor de doença altamente contagiosa, assim 
identificado como o novo coronavírus, demandou  da Organização Mundial 
de Saúde declarar em 30 de janeiro de 2020, que a propagação da covid-19
 significava uma emergência de saúde pública de importância 
internacional,  o mais alto nível de alerta da OMS, de acordo com o 
preceituado no Regulamento Sanitário Internacional e, sequencialmente, em 11 de março de 2020, a doença foi classificada pela mesma entidade como uma pandemia.
Cientes
 dos resultados nada alvissareiros divulgados pela imprensa 
internacional, as autoridades governamentais brasileiras não tardaram a 
determinar a imposição de rigorosas restrições sanitárias, consistentes 
no fechamento ou interrupção temporária de atividades comerciais e 
industriais, fato este que, de imediato, como que em reação em cadeia, 
passou a impactar o aumento do desemprego, o encerramento de empresas, a
 suspensão de contratos de trabalho, entre outros efeitos deletérios, 
daí decorrendo grave preocupação de todos os gestores, inclusive aqueles
 que tem sob a sua égide a responsabilidade direta ou indireta na gestão
 condominial. 
Algumas
 questões passaram a ser formuladas, no sentido de se seria possível 
suspender ou reduzir as cotas condominiais, se se fazia recomendável 
fazer uso do fundo de reserva para atendimento das despesas correntes, 
bem como se seria possível mitigar despesas de toda ordem, tudo para o 
fim de manter equilibrada e preservada a saúde financeira do condomínio 
em tempos de pandemia. 
Para
 melhor explicitar o nosso entendimento a respeito do que pode ou não 
ser feito para manter a equação econômico-financeira estável, mesmo 
diante da brutal instabilidade que nos cerca, enunciamos alguns aspectos
 que preferimos classificá-los numa primeira categoria denominada de 
"medidas intangíveis" e de um segundo grupo, chamado de "medidas 
flexíveis".
No
 bojo das medidas intangíveis situa-se, precipuamente, a gestão das 
cotas condominiais regulares, a qual não deve ser fruto de nenhum tipo 
de alinhamento para menor, seja concedendo descontos, seja diferindo 
benesses de qualquer ordem, ao contrário, justamente nesse período de 
expressiva preocupação, deve o síndico atentar para a necessidade de 
aprimorar o acompanhamento do fluxo de pagamento mensal dos condôminos 
bem como o de otimizar junto à administradora ou departamento jurídico 
do condomínio, a dinâmica do processo de cobrança, que deve se pautar 
pela maior celeridade e efetividade possível, valendo-se para esse fim, 
em caráter aditivo, de ferramentas inteligentes e tecnológicas como as 
que se referem aos softwares de gestão financeira, bem como de 
mecanismos de auto ou de heterocomposição, tais como a conciliação e a 
mediação.
O
 caráter intangível da manutenção regular do pagamento das cotas 
condominiais decorre do fato de que, mesmo durante o período de crise 
sanitária, o condomínio terá que prosseguir arcando com as chamadas 
despesas correntes, mesmo as que dizem respeito ao pagamento de 
funcionários ou de serviços proporcionados por empresas terceirizadas, 
assim como as contas de consumo em geral, sendo certo que a pandemia, de
 per si, não se descortina como uma situação especial que justifique o 
inadimplemento dos condôminos.
Assim
 se, por um lado, o condômino persiste diante de sua indissociável 
obrigação de pagar regularmente a cota condominial, como tal determina a
 lei, eis que nesse sentido preconiza o art. 1336, inciso I do Código Civil, ser dever do condômino "contribuir para as despesas do condomínio...",
 de outro lado, segue sem solução de continuidade, como múnus 
inafastável do síndico, a prerrogativa vinculante de "cobrar dos 
condôminos as suas contribuições..." (art. 1348, VII do Código Civil), 
eis que as cotas condominiais se prestam, sobretudo, para a conservação e
 a guarda das partes comuns e regularidade da prestação dos serviços que
 interessem aos possuidores, como assinala com propriedade o inciso V do
 art. 1348 do mesmo diploma legal.
Na
 seara das medidas flexíveis, nos referimos a realização de estudos de 
obtenção de receita extra a partir da identificação de eventuais áreas 
comuns que se encontrem sem uso ou subutilizadas que possam ser 
alugadas, bem como o início de um processo de renegociação imediata de 
contratos com prestadores de serviço objetivando a distensão dos 
compromissos ou ajustamento de regras de flexibilização das obrigações 
negociais, tanto a partir da redução de  valores como da possível 
fixação de valor fixo programado por período determinado.
Situam-se
 ainda nesse segundo grupo a realização de frentes de trabalho 
multitarefa com os próprios condôminos, objetivando alcançar possíveis 
resultados financeiros que, ainda que diminutos, podem trazer efeitos 
benéficos como a integração dos moradores e o fortalecimento do senso de
 convivência comunitária.
Outra
 medida que se situa no campo das possíveis ações é a realização de uma 
campanha para contenção e redução do consumo de água e de energia 
elétrica da área comum, eis que sabidamente as unidades tendem a ter um 
número maior de pessoas no ambiente residencial, potencializando o 
aumento de despesas nessa área; para esse fim, o fechamento de piscinas,
 salões de festas e demais áreas de convivência, já terão, a par de 
garantir a observância dos cuidados com a saúde, contribuído igualmente 
para a redução das despesas próprias da manutenção. 
Uma
 medida mais arrojada, mas plenamente possível, e que deve ser 
perquirida a partir do exame acurado da realidade financeira de cada 
condomínio, tangencia a realização de tratativas com entidades bancárias
 buscando a obtenção de crédito especial e a realização de acordos com 
agências de governo e com concessionárias de serviço público 
responsáveis pela cobrança de taxas, preços públicos e tributos 
diversos, tendo como parâmetro a sinalização constante dos atos 
normativos expedidos pelos entes governamentais. 
No
 que tange a gestão dos empregados, pode ser estudada a adoção de 
redução de salários vinculada à obrigação de manter os postos de 
trabalho, bem ainda a concessão de férias aos colaboradores com 
compromisso de pagamento ulterior dos salários, tudo em conformidade com
 o disposto na MP 936/20 que
 institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e 
trata da aplicação de medidas trabalhistas complementares para o 
enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente do coronavírus.
 
Entendemos
 de toda forma prudente, seja a partir das medidas intangíveis, seja com
 respeito às medidas flexíveis, observar com especial atenção o status 
da inadimplência, pois esta corre de fato o risco de se potencializar 
durante o período de pandemia e o que vier a lhe suceder, não olvidando o
 fato de que o síndico segue indicado na lei como o responsável direto 
por observar o cumprimento com exatidão das normas que regem o 
condomínio e que nesse momento de especial comoção se encontram a sua 
disposição para realizar um processo de gestão inovador, indispensável 
para atravessarmos com êxito esse grave momento que a todos nos atinge. 
 _________ 
*Vander Ferreira de Andrade é
 advogado. Especialista, Mestre e Doutor em Direito pela Pontifícia 
Universidade Católica de São Paulo. Professor Titular de MBA em Direito 
Imobiliário das Faculdades Legale (São Paulo). Professor Titular de 
Direito Imobiliário da Escola Superior de Direito (Goiânia). Coordenador
 de Cursos de Formação de Síndicos Profissionais, de Gestores Prediais e
 de Administradores de Condomínio. Atualmente é Presidente da Associação
 Paulista de Síndicos Profissionais e Pró-Reitor de Administração e 
Planejamento do Centro Universitário Fundação Santo André.
Fonte: https://www.migalhas.com.br/depeso/326779/gestao-financeira-de-condominios-em-tempo-de-covid-19
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